Obs.: Este verbo é antecedido do prefixo “pro” (proginóskō) em 5 ocorrências: At 26:5; Rm 8:29; 11:2; 1Pe 1:20 e 2Pe 3:17, significando um conhecimento prévio.
A palavra geralmente traduzida como “conhecer” é a tradução do verbo grego ginóskō, cujo sentido pode expressar também o significado de “haver um relacionamento” e não apenas de um mero “conhecer de se ouvir falar.” Percebemos isso logo na primeira vez em que tal palavra aparece no Novo Testamento, em Mateus 1:25.
“E José, despertando do sono, fez como o anjo do Senhor lhe ordenara, e recebeu a sua mulher; e não a conheceu até que deu à luz seu filho, o primogênito; e pôs-lhe por nome Jesus.”
(Mateus 1:24,25)
Evidentemente, José e Maria já se conheciam antes mesmo de se tornarem noivos. Sendo assim, conhecer, dentro desse contexto, trata-se de um eufemismo para a intimidade que o casal só haveria de ter após realizar-se o casamento.1
Além desse eufemismo, ginóskō pode também significar algo mais que um “conhecer meramente de se ouvir falar”. Quando, por exemplo, alguém diz que conhece fulano, isso pode apenas significar que ele sabe o nome de tal pessoa, ou que o conhece superficialmente. Porém, há contextos em que ginóskō significa “haver um relacionamento”, ou seja, um conhecer com intimidade, embora não necessariamente no sentido conjugal, ou sexual. Essas ocorrências específicas estão sempre relacionadas ao relacionamento do homem com Deus. Dois exemplos encontram-se em Mateus 7:23 e 1 Coríntios 8:3, onde a tradução de ginóskō aparece abaixo em destaque:
“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade.”
(Mateus 7:21-23)
“E, se alguém cuida saber alguma coisa, ainda não sabe como convém saber. Mas, se alguém ama a Deus, esse é conhecido dele.”
(1 Coríntios 8:2,3)
No primeiro exemplo, o Senhor dirá “nunca vos conheci” não porque ele não soubesse da existência daquelas pessoas, mas porque elas, apesar de o chamarem de Senhor, não mantinham um relacionamento amoroso com ele. Isso se confirma no segundo exemplo, onde fica bem esclarecido que o amor que temos para com Deus é que nos torna conhecidos dele.2 Confira João 14:23.
As passagens onde “conhecer” tem o significado de “haver um relacionamento com Deus” são as seguintes: Mateus 7:23; Lucas 10:22; João 1:10; 8:19,31,32,55; 10:14,15,27; 14:7,17,20; 16:3; 17:3,25; Romanos 8:29; 11:2; Gálatas 4:9; Efésios 3:19; Filipenses 3:10; 2 Timóteo 2:19; Hebreus 8:11; 1 João 2:3-6,13,14; 3:1,6,16,24; 4:6-8,13,16; 5:20; 2 João 1.
Portanto, embora nem sempre conhecer signifique algo mais profundo, há contextos em que a sua conotação é precisamente esta: a de se conhecer “por experiência de união e intimidade”3. Como podemos notar nas referências acima, tais ocorrências são mais frequentes no evangelho segundo João, bem como na primeira epístola joanina. Porém, há também outras passagens do Novo Testamento onde conhecer possui o significado de relacionamento – e, especificamente, de haver um relacionamento com Deus. Mas não há necessidade de memorizarmos tais referências, pois o próprio contexto de cada uma delas torna óbvio quando conhecer necessita ser assim compreendido.Notas:
1. Mateus 1:25 deixa implícito que, após Jesus nascer, José conheceu Maria, ou seja, intimamente falando, e que certamente tiveram filhos, os quais são mencionados como irmãos de Jesus (Mt 12:46; 13:55s; Mc 3:31; 6:3; Lc 8:19; Jo 2:12; 7:3; At 1:14). Evidentemente que não há qualquer pecado nisso, pois José e Maria eram devidamente casados.
2. Os que amam a Deus é que são conhecidos dele. Tal entendimento se torna especialmente importante para compreendermos Romanos 8:28-30, passagem onde também se deve saber que a palavra grega traduzida como predestinou, na verdade significa “predeterminou”, ou “designou antecipadamente”, e nada tem a ver com o destino particular de alguém ser previamente traçado. O que Paulo está explicando é que aqueles que amam a Deus se tornam conhecidos dele, no sentido de haver com Deus um relacionamento; e a estes, que dantes conheceu, Deus previamente determinou, ou “designou antecipadamente para que fossem moldados segundo a imagem de seu filho” – como corretamente interpretou N. T. Wright em sua tradução do Novo Testamento. Logo, o que Deus predeterminou é que todos quanto o amarem sejam moldados segundo o caráter de Jesus Cristo, sem haver qualquer acepção de pessoas.
3. JUAN MATEOS, Vocabulário Teológico do Evangelho de João, 2ª ed., Paulus, 2019, p. 38.