Dentre as 45 ocorrências de thlípsis no Novo Testamento, nem sempre esse termo grego é traduzido para o português como “tribulação”, embora o sentido seja sempre o de uma situação de pressão ou dificuldade. Literalmente, esse vocábulo significa o “ato de prensar, espremer, ou apertar”.1
Em certas passagens algumas versões em português traduzem thlípsis como aflição, angústia, sofrimento ou termos semelhantes. Vejamos alguns exemplos comparativos:
João 16:33a
No mundo tereis tribulações, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo.
(King James 1611 – e TB, A21, BJ, BP)
No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo.
(Almeida Corrigida Fiel – e ARC, ARA, NVI, NAA, NVT)
Mateus 13:21
Mas ele não tem raiz em si mesmo, apenas dura um tempo; pois quando vem tribulação ou perseguição por causa da palavra, imediatamente se esmorece.
(King James 1611 – e TB, A21, NVI, BJ, BP)
Mas não tem raiz em si mesmo, antes é de pouca duração; e, chegada a angústia e a perseguição, por causa da palavra, logo se ofende.
(Almeida Corrigida Fiel – e ARC, ARA, NAA)
2 Coríntios 2:4a
Porque em muita tribulação e angústia do coração vos escrevi.
(Almeida Corrigida Fiel – e TB, A21, BJ)
Porque no meio de muitos sofrimentos e angústias de coração vos escrevi.
(Almeida Revista e Atualizada – e NAA)
Porque em muita aflição e angústia do coração eu vos escrevi.
(King James 1611 – e NVI)
As ocorrências de thlípsis se referem quase sempre à pressão e dificuldade que sofrem os justos. Em apenas três versículos (Romanos 2:9, 2 Tessalonicenses 1:6 e Apocalipse 2:22), esse termo grego foi utilizado como recompensa para quem faz o mal; e apenas numa passagem thlípsis refere-se às tribulações dos israelitas no Antigo Testamento (Atos 7:10-11). Em todas as demais ocorrências quem está sofrendo tribulação são os justos por causa da sua fidelidade ao Senhor.2
Em Romanos 5:3, Paulo esclarece que o propósito da tribulação na vida dos fiéis a Cristo é que se desenvolva a perseverança, a experiência (caráter provado)3 e a esperança, revelando-se assim quem realmente é convertido ao Senhor (Mt 13:21; Mc 4:17; At 14:22; 2Co 4:17; 8:2; 2Ts 1:4-5).
1. O ato de prensar ou espremer nos faz lembrar do processo de esmagamento pela qual passam as azeitonas para se extrair o azeite, e as uvas para se extrair o vinho. Embora thlípsis não fosse o termo utilizado para esses procedimentos agrícolas, certamente o objetivo da tribulação é o de se extrair o que está dentro de cada um, ou seja, tornar notório quem é fiel a Deus e quem não é. Sendo assim, a tribulação tem o propósito da depuração, isto é, da identificação dos verdadeiros discípulos de Cristo.
2. No estudo da escatologia há teólogos que associam o período da “grande tribulação” (Mc 13:19; Mt 24:9,21; Ap 7:14) com passagens que mencionam a “ira de Deus” (Rm 2:5-8; Ef 5:6; Cl 3:6; 2Ts 1:7,8; Ap 6:15-17; 11:18; 14:10-11; 16:19; 19:15). Porém, não há consenso a esse respeito. Muitos teólogos entendem que a “grande tribulação” se refere à perseguição dos justos promovida pelos ímpios que deverá ocorrer antes do derramar das taças da “ira de Deus” (Apocalipse 15 e 16). Quanto à Apocalipse 3:10, não há nesse versículo nem uma expressão, nem outra, mas sim “hora da provação”, que pode significar um grande teste de fidelidade, podendo ou não ter alguma relação com a “grande tribulação”.
3. Embora a maioria das versões traduzam dokimê como “experiência”, o tradutor Frederico Lourenço preferiu a expressão “prova de caráter”, explicando na nota de rodapé de Romanos 5:3 que “o sentido que Paulo parece atribuir à palavra é ‘prova’ (no sentido de ‘teste’, mas também de ‘comprovação’). No presente versículo da Carta aos Romanos, dokimê parece sugerir a disponibilidade de nos deixarmos pôr à prova: daí que leiamos, em algumas traduções no NT, dokimê traduzido por ‘caráter’.” Frederico LOURENÇO. Bíblia, volume II: Novo Testamento. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.
Escrito por Alan Capriles
Atualizado em 11/07/2025